O TRADICIONALISMO
BRASILEIRO
Ubiratan
Borges De Macedo
1. Introdução
Os tradicionalistas brasileiros no século XIX
tinham uma consciência clara das suas teses
filosóficas, religiosas e sociais, como a defesa
da monarquia legítima, da união Igreja
e Estado, da proscnçao do casamento civil,
da liberdade de imprensa e de pensamento em nome
dos direitos da verdade. Mas, a nível político,
excetuando a preferência pela monarquia, reinava
uma imprecisão quanto às opções.
Era ainda o que se verificava na primeira geração
tradicionalista do século XX brasileiro, constituída
pelo escritor Eduardo Prado, pelo jurista João
Mendes, pai do processualista João Mendes
Júnior, Porfírio de Aguiar e, no Rio,
por Carlos de Laet.
A defesa da monarquia, derrubada em 1889, esgotava
o ânimo deste grupo, impedindo maior contéúdo
doutrinal. Outro fator a embaraçar o desenvolvimento
da corrente política é sua estreita ligação
com o catolicismo, embora sejam dissociáveis,
sobretudo a partir do pontificado de Leão XIII
e da condenação dos fundamentos filosóficos
do sistema pelo Concílio Vaticano I e a
permissão de adesão à República,
na França. No Brasil, a Igreja relembrou
a antiga tese escolástica da equivalência
em abstrato dos regimes políticos, esquivando-se
a um compromisso maior com a monarquia e procurando
dar um cunho ético à sua atuação
pública bem como à dos católicos,
despolitizando-os, face às suspeições
jacobinas da jovem repúbica.
Exemplo característico desse alheamento político
dos tradicionalistas nas primeiras décadas
dó século é a trajetória
intelectual de Alexandre Correia (1890/1984),
figura de relevo na formação dos escóis
católicos e tradicionalistas desse século.
Doutorando-se em Louvaina, em 1914, com uma tese
sobre a “Política de Joseph de Maistre”,
seus trabalhos posteriores orientam-se para a teoria
pura: filosofia geral e educacional, e trabalhos de
erudição, como a tradução
da Suma Teológica, sem frutificarem
em trabalhos políticos, como seria de se esperar
pela tese.
Todavia, Alexandre Correia não será nunca
um puro filósofo tomista, como pode parecer
para alguns. Subjacente a todos os seus trabalhos está o
tradicionalismo como ideologia política, desde
mencionada tese de 1914 ou sua conferência de
1907 sobre a Providência Divina, inspirada
nos temas de De Maistre, ou ainda na tese
de 1917, Há um Direito Natural? Qual o seu
Conceito?, passando pela Concepção
Histórica do Direito (1934), até seu último
trabalho, O Tomismo é Incompatível
com o Marxismo (1976). As “razões” tomistas
aparecem subordinadas a um quadro geral de procedência
tradicionalista, mais precisamente a de J. Maistre.
Este, para Alexandre Correia, de “pensamento
espantosamente clarividente, rasga-nos luminosas
perspectivas para o futuro” e sempre se opõe “à desbragada
democracia de Rousseau”; sua política “é a
verdade sempre imutável da tradição”.
Após esta primeira geração de
tradicionalistas, aparece uma segunda que florescerá nas
décadas de trinta e quarenta e que vai assumir
uma feição política explícita.
2. O grupo da Ordem
Em 1922, Jackson de Figueiredo (1891/1928) funda o
Centro Dom Vital e a revista A Ordem, como
seu órgão, no Rio de Janeiro, que durará até 1964.
Será, sob a direção de Jackson,
até sua morte, uma revista tradicionalista e,
ao depois, sob a direção de Alceu Amoroso
Lima, até 1937, abrigará tradicionalistas.
Nesse ano, a Guerra Civil Espanhola dividirá os
católicos brasileiros, deixando na Ordem os
maritainianos progressistas; os tradicionalistas
procuram abrigo noutras revistas.
Todos concordam em situar Jackson (1) na linha do
tradicionalismo francês, aditando influência
dos teóricos da Ação Francesa,
Maurras e L. Daudet, e de Antonio Sardinha, com o Integralismo
lusitano.
F. Iglésias exagera ao apontar em Jackson a “primeira
manifestação conseqüente do reacionarismo
no país”. (2) Seja como for, iniciou uma
obra sobre Joseph de Maistre e a Contra-R
evolução e trouxe o tradicionalismo
das paragens da filosofia para o domínio
da política, desenvolvendo vigorosa pregação
pelo nacionalismo, pela autoridade, pela tradição
católica e pelo moralismo, sobretudo em Do
Nacionalismo na Hora Presente (1921), A Reação
do Bom Senso (1922), A Coluna de Fogo (1925)
e em A Questão Social na Filosofia de Farias
Brito (1919).
Nestes livros já estão esboçados
todos os temas tradicionalistas: a denúncia
da Revolução como obra satânica,
corporificando-se na Revolução Francesa
e bolchevista e no projeto político de uma sociedade
laica, sem Deus e sem hierarquia; separação
Igreja-Estado; educação neutra; democratismo
político apoiado no sufrágio universal,
apontado como inorgânico e irresponsável;
reforma da política elitista, etc. Mas ainda
não há um projeto político explícito.
O discurso ideológico situa-se a nível
dos fundamentos filosóficos da política.
Aderem à pregação de Jackson:
Perillo Gomes, que irá denunciar O Liberalismo (1932),
Hamilton Nogueira, com a Doutrina da Ordem, Jonathas
Serrano, E. Vilhena de Moraes, Lucio José dos
Santos, em Minas, Alcebíades Delamare, que iria
para o Integralismo, e Alceu Amoroso Lima, que adere
apenas parcialmente ao ideário tradicionalista
nos seus primeiros livros. O Cardeal D. Manuel
G. Cerejeira, analisando o grupo do Centro D. Vital,
escreve: “pela sua ação contra-revolucionária,
estes autores procedem todos de José de Maistre
e oferecem grande afinidade com os integralistas portugueses”.
(3)
3. A Pátria Nova
No ano da morte de Jackson, em 1928,
funda-se em São Paulo a “Ação
Imperial Patrionovista”, com Arlindo Veiga dos
Santos, Paim Vieira e Sebastião Pagano que estabelecem
as bases de um projeto político tradicionalista.
Os inspiradores são os clássicos De Maistre,
Bonald, Raulica, Tapareili D’Azeglio e A. Sardinha.
O projeto é a
restauração de uma monarquia tradicional
(imperador reina e governa), corporativista e nacionalista;
união Igreja-Estado; representação
orgânica, isto é, corporativa; mandato
vinculado; voto familiar e distrital; descentralização
administrativa; concentração política;
capital no centro do império; antiimperialisrno;
redivisão administrativa do país em províncias
menores, com caráter puramente administrativo
e conseqüente extinção da federação;
ensino cristão; valorização das
Forças Armadas; criação da nobreza;
promoção das indústrias siderúrgica
e atômica (na revisão do programa, em 56); reaparelhamento
militar, conduzindo à política de grande
potência; unificação e nacionalização
da Justiça e das Polícias Militares;
restabelecimento da Polícia Municipal; política
internacional voltada para o Ocidente; integração
no mundo hispânico e colaboração
especial com Portugal (4).
A Pátria Nova foi um movimento restrito, mas
exerceu forte influência por sua participação
na Sociedade de Estudos Políticos (SEP), do
início da década de trinta, e na criação
do Integralismo, que contou com a participação
de numerosos tradicionalistas, como o grupo da
revista Tradição, em Fortaleza,
de Denizard Macedo. Este grupo edita, em 1941, um volume
de Estudos sobre J. Maritain, violento ataque
ao Humanismo Integral do filósofo francês.
Vinculado à AIPN, encontramos a figura estranha
do conde Sebastião Pagano, autor, em 1938, do
livro O Conde dos Arcos e a Revolução
de 1817, uma das obras onde o tradicionalismo
se apresenta em estado puro e aplicado ao Brasil.
O livro é um libelo contra Pombal e o espírito
revolucionário; contra os judeus e a maçonaria;
e a defesa da ação repressiva, do
Conde dos Arcos, na sedição de 1817.
Encontramos ainda Authos Pagano, irmão do precedente,
autor do ensaio sobre direito natural, e C. Ataliba
Nogueira, autor de O Estado é Meio
e não Fim e Pena sem Prisão.
Neste, defende o banimento, o degredo para a Amãzônia
e outras penas tradicionais do livro V das Ordenaçõe.
Acresce a sua recente reabilitação
da figura de Antonio Conselheiro, em volume da “Brasiliana”,
como líder monarquista espontaneamente surgido
do povo. Portanto, uma liderança concreta do
Brasil real cristão, por oposição às
lideranças abstratas do Brasil oficial e artificiais,
desde que não cristãs e não monarquistas.
4. As revistas Reconquista e Hora
Presente
Ainda em São Paulo, encontramos, nos anos de
1950, 1951 e 1952,apublicação Reconquista, periódico
político-doutrinário dirigido também à Espanha
e Portugal, sendo representante, no Brasil, do tradicionalismo
de inspiração ibérica, antes que
francesa, de Vazques de Mella, A. Sardinha, Vitor
Pradera, Donoso Cortés, J.Balmes, Gil Robles
e outros.
Dirigente significativo do movimento foi José Pedro
Galvão de Souza (1912/1992), com a colaboração
de Clóvis Lema Garcia, Arlindo Veiga dos Santos
e o filósofo espanhol Francisco Elias de Tejada.
Este grupo é o mais conscietne de sua posição
e, após o encerramento do periódico que
alimentava, passou para a revista e editora Hora
Presente, em 1968, junto com Adib Casseb, Alfredo
Lage, José Orsini, Italo Galli, Alfredo Rabelo
Leite, Gerardo Dantas Barreto, Alfredo Buzaid, Clovis
L. Garcia, Ricardo H Dip e outros. Isto após
alguns terem r’articipado da fundação
da revista e do grupo Convívio, que
abandonaram por discordarem de sua orientação
não tradicionalista, aberta às novas
correntes do pensamento cristão e favorável à democracia.
A figura exponencial deste grupo, e talvez de todo
o tradicionalismo político, é, sem
dúvida, José Pedro Galvão de Souza.
Filósofo e constitucionalista com sólida
formação tomista e tradicionalista, na
linha espanhola. Escreveu numerosos trabalhos
em defesa de suas teses.
Dentre estes, a exposição mais completa
do tradicionalismo político: Política
e Teoria do Estado (1957) onde expõe a
doutrina tradicionalista do Município,
base dessa ideologia política. Em segundo lugar, O
Problema do Corporativismo; depois A
Representação Política; em
quarto, As Liberdades Pessoais e Liberdades
Locais; por último, propõe uma revisão
do Direito Público em favor da descentralização
administrativa e contra o federalismo.
O tema do Corporativismo seria retomado num opúsculo
de 1963, Socialismo e Corporativismo, em face
da Encíclica Mater et Magistra. Nova
evolução política, com uma denúncia
brilhante do liberalismo, aparece na sua Introdução à História
do Direito Político Brasileiro (1954), também
analisado nas suas Perspectivas Históricas
e Sociológicas do Direito Brasileiro (1961)
e em Raízes Históricas da Crise Política
Brasileira (1965).
Tema similar reaparece em A Constituição
e os Valores da Nacionalidade (1971). A
Representação Política é minuciosamente
estudada em tese no mesmo ano. O totalitarismo e
a tecnocracia são denunciados como fenômenos
de massas rebeladas contra as elites — aristocracia
natural — no seu O Totalitarismo nas
Origens da Moderna Teoria do Estado (1972) e
no Estado Tecnocrático. Um livro
de 1970 retoma um tema caro a essa ideologia: A
Historicidade do Direito e a Elaboração
Legislativa. Em 1977 retoma sua tese de 1940
sobre “O Positivismo Jurídico e
o Direito Natural”, junto com trabalhos conexos
apresentados nas Jornadas Brasileiras de Direito
Natural (1977). Nestas, reuniram todos os tradicionalistas
brasileiros, sob este lema geral: Direito
Natural, Direito Positivo e Estado de Direito (1977).
A política externa tradicionalista é exposta
em O Brasil no Mundo Hispânico (1962)
e na Formação Brasileira e Comunidade
Lusíada (1954). Nestes livrossão
formuladas as seguintes diretrizes para a nossa
política externa: 1) comunidade lusíada,
panamericanismo e hispano-americanismo; 2) política
afro-asiática;3) desenvolvimento econômico
a ser feito com ajuda norte-americana — “justificando-se
tal ajuda pela nossa colaboração leal
com nossos aliados do norte do continente na defesa
do hemisfério”; 4) cooperação
econômica com o mundo livre; e, 5) valorização ética
e cultural de nossas tradições e da família.
Os fundamentos filosóficos da vida social abordou-os
José Pedro em livro de 1.949, Conceito e
Natureza da Sociedade Política, afim, no
título, ao de João Camilo de Oliveira
Torres, Natureza e Fins da Sociedade Política. Afinidade
que abrange o apego à monarquia, se bem que
João Camilo tinha uma abertura ao maritainismo,
ao liberalismo e ao social, ausentes em José Pedro.
Na imensa obra de João Camilo de Oliveira Torres
(1916/1973) podem rastrear-se temas tradicionalistas
em Do Governo Régio (1958), Harmonia
Política (1961), Um Mundo em Busca
de Segurança (1961). Porém,
a Libertação do Liberalismo (1949),
e a própria Democracia Coroada (1957), visão
liberal da teoria política do império
brasileiro, afasta-no dessa grei.
José Pedro é, ainda, entre nós,
o erudito tradutor e prefaciador de Donoso Cortés: A
Civilização Católica e os Erros
Modernos (1960).
5. A TFP
Oriunda do grupo do jornal O Legionário, que
se editou na década de 30 em São Paulo,
e do movimento das Congregações
Marianas, surge, em 1960, a Sociedade Brasileira de
Defesa da Tradição, Família
e Propriedade (TFP), a qual adotou como seu órgão
o mensário O Catolicismo, editado em
São Paulo sob a responsabilidade do bispo de
Campos, D. A. Castro Mayer.
De movimento integrista, interno à religião
católica, passa, após 1960, a ser
um movimento político, um grupo de pressão
conservador, sem querer assumir o status de
partido político para poder influir sobre
os existentes.
Seu primeiro trabalho político é a publicação,
em 1960, da Reforma Agrária, Questão
de Consciência, de autoria de D.Mayer, D.
Geraldo Proença Sigaud, do prof. Plínio
Correia de Oliveira e de Luis Mendonça de Freitas.
O livro retoma no Brasil uma atitude “essencialmente
reacionária”. Sê atribuirmos
a este último adjetivo o significado pejorativo
usual, parece qualificação muito adequada à TFP.
Reação contra o socialismo e o comunismo,
contra a repercussão dessas ideologias na política,
na legislação, na religião, contra
as inovações culturais, contra as atualizações
rituais, pastorais e de costumes na Igreja; contra
... Enfim, um dique destinado a deter o
tempo em seu curso natural, que 00estabilize o passado
no passado. Entidade reacionária, mas de uma
espécie de reação atuante, presente,
usando da violência, se necessário”.
(5)
Sua defesa da estrutura agrária e do latifúndio
fizeram o jornal da esquerda católica, Brasil
Urgente, publicar uma charge onde, segundo a TFP,
o pecado original de Adão e Eva foi terem comido
uma maçã que não era de sua propriedade!
Dentro do panorama do tradicionalismo, a TFP (hoje
com filiais pelo mundo) caracteriza-se pela sua intolerância,
ativismo e predileção pelo aspecto
social e econômico da ideologia. Além
da oposição formal a qualquer alteração
da estrutura fundiária do país,
a “Declaração de Monte Alto”,
dos mesmos autores citados, preconizou um programa
de assistência creditícia ao proprietário,
tentando inverter a tendência moderna e reestruturar
a sociedade brasileira com o predomínio de base
agrária e, nesta, da grande propriedade rural.
Temas centrais da pregação tefepista
são o anticomunismo e a idéia de desigualdade
reputada essencial à sociedade. Por isto, os
escritos dos bispos citados, e de Plínio Correia
de Oliveira, no jornal O Catolicismo,
preconizam continuamente a reabilitação
da nobreza, destacando o seu papel essencial na reta
constituição social. Exemplo extremado
--e característica da mensagem da TFP-- é a
Carta Pastoral sobre a Seita Comunista, de
D. Geraldo Proença Sigaud, publicada em
janeiro de 1962. Nela, após exposição
das teorias fundamentais do marxismo e de sua ação
--inclusive negando qualquer validade às posições
do socialismo democrático e/ou cristão--,
denuncia-se “o perigo de um putsch comunista”,
alertando a Nação sobre infiltração
nas universidades, nas organizações estudantis,
nos meios de comunicação, nos sindicatos
e nas associações católicas.
Não seria de estranhar, pois, a ação
da Revolução de 64 contra as mesmas
entidades, apoiadas em denúncias como as
de D. Sigaud.
Para contrabalançar tais ações, Dom
Sigaud preconiza urna luta contra o comunismo a nível
doutrinário, defendendo com ênfase
a propriedade privada (6).
A essa ação no plano teórico,
deveriam seguir-se medidas práticas contra
a ação do Partido Comunista, a exemplo
das seguintes: 1) legislação destinada
a reprimir o comunismo; 2) ruptura das relações
diplomáticas e comerciais com a Rússia;
3) proibição efetiva do PCB; 4) expurgo
dos propagandistas e agentes comunistas nos meios militares,
estudantis, sindicais etc.; 5) expurgo nas
empresas privadas; 6) expurgo nas repartições
públicas e organismos para-estatais; 7) eleições
de deputados e senadores anticomunistas e anti-socialistas.
A Pastoral está ainda atenta
ao combate ao que denomina de “comunismo
difuso”. Entre as recomendações
ao seu clero, destacamos textualmente as duas
seguintes:
“Educai os fiéis no amor da ordem desigual
que Deus quer. Em lugar de alimentarem antipatia de
desigualdade, ensinai-os a terem amor da desigualdade.
Mostrai que está segundo a ordem da Providência
que, dentro de certos limites, haja alguns miseráveis,
para os quais se exerça a caridade individual
e a organizada, muitos que lutem pelo pão quotidiano;
muitos remediados que tenham sobras; alguns ricos,
que possam exercer em maior escala funções
de caridade, de zelo, cultura, arte, progresso
e apostolado; e até alguns poucos muitíssimos
ricos, aos quais além das mesmas funções
de zelo e caridade toque cultivar as virtudes
da magnificência e da munificência. No
corpo da sociedade todas estas escalas de riqueza são úteis
e necessárias”.
A segunda diz respeito à educação
da infância e juventude: “procurai imunizar
os corações contra o veneno do socialismo,
impregnando as almas das crianças e dos
jovens do espírito hierárquico”.
E, prossegue: “Este espírito de hierarquia
não ficará apenas em teoria. O ambiente
e os costumes das nossas escolas e colégios
devem estar impregnados deste espírito e devem
impregnar dele nossos meninos e jovens. Assim
os levaremos a amar com entusiasmo a ordem católica,
a Cristandade, e a odiar do fundo da alma a Revolução e
os ideais satânicos” (7).
Dado
o ambiente político da época, é fácil
imaginar o impacto desse tipo de pregação,
em certos s meios, nos anos de 1962 e 1963.
Mas, a Pastoral é tão reveladora
das teses da TFP que necessita de mais comentários.
Ao lado destas medidas doutrinárias e práticas
de combate ao comunismo difuso, há ainda um
programa de ação positiva. Este abrange
a luta contra a miséria, na qual deve-se tomar
todo cuidado em não pregar a luta de classes
ou favorecer “o ódio contra os ricos” e
tendo-se presente que a justiça não resolve
a questão social: “É mister que
a caridade complete o trabalho da justiça, e
o amor da pobreza e o desapego dos bens da terra...
Porque o convívio humano será sempre
recheado de sofrimento, e a justiça sozinha
jamais resolverá todos os conflitos” (8) Mormente
porque se sabe que não se pode vencer o comunismo “somente
melhorando a situação aflitiva de
certas classes operárias que o marxismo explora”,
pode-se, com a melhoria, atrapalhar a propaganda
comunista porque sua origem é ideológica,
ou melhor teológica: é a revolta humana
contra Deus,
Outra medida positiva é um programa de reforma
agrária que não se proponha tocar na
propriedade privada mas em promover a colonização
das terras pertencentes ao Estado, com crédito
fácil e barato, eletrificar o interior
etc. E, em terceiro lugar, organizar o homem
do campo em entidades anticomunistas.
Convoca, D. Sigaud, a “mobilização
de todos os recursos na luta anticomunista”;
denuncia o “crime da terceira força”,
enfatizando que “a sorte do mundo cristão,
a sobrevivência de um clima de liberdade, está atualmente
ligado à vitória dos Estados Unidos”.
E, finalizando, lembra a Pastoral, com
tranqüila indiferença aos hábitos
bem pensantes da inteligentzia nativa, que “em
1962, o Governo de Washington enviará aos Bispos
do Brasil, para distribuírem aos pobres, trinta
milhões de quilos de leite em pó,
fubá, farinha de trigo etc. Sejamos gratos a
esse povo que, em lugar de queimar as sobras de sua
produção, lembra-se de nossos irmãos
que curtem necessidade. E rezemos por nossos benfeitores
norte-americanos: recompensai com a vossa graça
e a vida eterna, Senhor, por amor de Vosso nome, a
todos os que nos fazem bem” (9).
São características da mensagem da TFP
a insistência em que ambientes, costumes,
roupas, estilos de vida e modas transparecem opções
políticas. Daí sua insistência
em denunciar trajes e costumes que seriam socializantes, recomendando
a seus membros trajes conservadores, cortes de
cabelo ortodoxos e atitudes impregnadas de hierarquia
e ordem. Idéias profundamente conservadoras
são veiculadas a respeito da mulher.
Outra atitude política característica
da TFP é o radicalismo político:
não há atitudes intermediárias;
ou se está certo com o bem, ou errado com o
mal. O recurso à violência é sempre
lembrado nas páginas de O Catolicismo como
indício de saúde e integridade moral.
Elogia-se sempre a santa violência ou afirma-se
que a paz no Ocidente só virá pela ponta
das lanças, etc. A intransigência,
sobretudo para com pessoas e organizações
de centro e centro direita, é praticada com
entusiasmo. Artigos comprazem-se em imaginar situações
onde os Estados Unidos, se certo de sua superioridade
atômica, provavelmente teria o dever de desencadear
um ataque nuclear de surpresa, contanto que destruísse
a União Soviética.
Plínio Correia de Oliveira (1908/1996), professor
de História, que foi o deputado mais votado à Constituinte
de 34, é o mentor intelectual do grupo,
ao lado dos bispos (Dom Sigaud afastou-se posteriormente
da TFP).
Após ter
escrito uma obra discutindo métodos de
ação pastoral da Igreja, Em Defesa
da Ação Católica (1943),
e de ter colaborado nas obras citadas sobre Reforma
Agrária, Plínio Correia de Oliveira escreveu,
em 1959, um ensaio fundamental no conjunto do
tradicionalismo político brasileiro. Referimo-nos
ao opúsculo Revolução e Contra-Revolução,que
foi logo traduzido para várias línguas,
docuimentando a importância mundial Alcançada
por essa corrente.
O mencionado ensaio faculta os fundamentos
filosóficos do tradicionalismo. Caracteriza a Revolução
como sendo não apenas um movimento localizado com a Revolução
Francesa, situando-a no plano da metafísica e da teologia da
história. A Revolução é um inimigo temível
que inspira uma cadeia de ideologias e que está por detrás
da Reforma Protestante, da Revolução Francesa e do Comunismo.
A Revolução (com “erre” maiúsculo) é a
luta contra a “Cristandade medieval. Ora, essa Cristandade medieval não
foi uma ordem qualquer, possível como seriam possíveis muitas
outras ordens. Foi a realização, nas circunstâncias inerentes
aos tempos e lugares, da única ordem verdadeira entre os homens,
ou seja, a civilização cristã” (10). Ela é uma
luta contra “a disposição dos homens e das coisas segundo
a doutrina da Igreja, Mestra da Revelação e da Lei Natural”.
Esta disposição é a ordem por excelência. O que
se quer implantar é, per diametrum, o contrário disto.
Portanto, a Revolução por excelência! O ensaio assume tons
agostinianos: a luta entre o Bem e o Mal, a Cidade de Deus e a Cidade Terrena,
se transforma em luta entre a Revolução e a contra-Revolução,
quase num maniqueísmo político. A Contra-Revolução
será uma luta em profundidade, sem compromisso algum, no plano das idéias,
da política, dos costumes etc. O contra-revolucionário
conhece a Revolução e a Ordem: “ama a Contra-Revolução
e a Ordem Cristã, odeia a Revolução e a anti-ordem”.
Faz desse amor e desse ódio o eixo em torno do qual gravitam todos os
seus ideais, preferências e atividades (11).
Em 1963, Plínio
editou um folheto que foi traduzido para oito línguas
e já superou de muito os 100.000 exemplares.
Trata-se de A Liberdade da igreja no Estado
Comunista — A Igreja, o Decálogo
e o Direito de Propriedade.
Após tratar com lógica radical do tema,
conclui que não seria lícito, mesmo para
evitar uma hecatombe nuclear, desistir do direito
de propriedade, pois “a existência humana,
sem instituições necessárias,
como a propriedade e a família, não vale
a pena ser vivida. Sacrificar uma ou outra para evitar
a catástrofe não importa em ‘propter
vitam vivendi perdere causas’?” Portanto,
rejeita a coexistência pacífica, salvo
se o comunismo deixar de sê-lo.
Em 1966, Plínio elabora outro best-seller,
Baldeação Ideológica Inadvertida
e Diálogo, onde o Diálogo, então
em grande voga, é analisado com grande profundidade
e brilhantismo, denunciado-o como manobra comunista.
E, em nota final, volta a seu leit-motiv: a
recusa do diálogo não levaria a uma
hecatombe nuclear? Plínio rejeita tal
hipótese e lembra que católicos
sinceros receiam mais o pecado do que a guerra onde,
segundo S. Agostinho, “se matam homens
destinados a morrer um dia.”
O maniqueísmo prático, a apologia da
violência, a rigidez doutrinária
caracterizam a opção política
da TFP. Aliás seu papel foi relevante na radicalização
da crise conducente a 31 de março de 1964.
Mas inexiste um projeto político preciso da
TFP. Sabe-se que seus dirigentes são monarquistas,
favoráveis à autoridade e anticomunistas,
mas pouco se vai além disto. Todavia, a TFP
fornece o clima em que podem se discutir os projetos
políticos tradicionalistas, como movimento influente
que de fato chegou a ser.
6. Grupo Permanência
Entrando em choque com Alceu Amoroso Lima (1893/1983),
no Centro Dom Vital, Gustavo Corção (1896/1978)
provoca uma cisão, abandona o Centro e cria
o Grupo Permanência e a Editora Presença.
Em 1968 começa a editar a Revista Permanência.
Além de Corção nele cooperam
Alfredo Lage, Gerardo Dantas Barreto, Helio Fraga,
J. Arthur Rios, D. Irineu Pena, Gladstone Chaves de
Melio e Julio Fleichmann. Foi precursor do grupo o
Pe. Arlindo Vieira, S. J.
Figura de excepcional valor literário,
Corção transitou de uma esquerda moderada
para o tradicionalismo nos seus últimos
livros O Desconcerto do Mundo, O Século
do Nada (1974) e Dois Amores-Duas Cidades (1967).
Neste, de inspiração agostiniana, elabora
com desigual e vasta erudição uma filosofia tradicionalista
da história, da qual destacamos um texto característico
do estilo e da doutrina. Combatendo o pacifismo
e a tolerância relativista que em tudo vê aspectos
positivos, pergunta: “por que lutar se tudo tem
um lado positivo? Repetimos: esse pacifismo é a
quinta essência, destilada, pasteurizada, licorosa,
adocicada daquela inimizade medular, moléculas
que a filosofia do Homem-exterior difundiu durante
quatro séculos. Comparadas a esse indiferentismo
ignóbil, as guerras mais horríveis são
ainda uma reação saudável
e cordial de uma pobre humanidade que se obstina em
crer que valha a pena lutar e morrer por uma palavra,
por uma mulher, por uma bandeira, por uma idéia,
e, com muitíssimo mais forte fundamento, por
um credo”. (12)
Ao contrário dos outros tradicionalistas, Corção
chegou às suas posições por uma
reflexão sobre S. Tomás e o primeiro
Maritain. De Maistre, Donoso Cortés pouca ou
nenhuma influência tiveram sobre ele. Apesar
do seu valor, nada touxe no campo das idéias
políticas.
Já Alfredo Lage, do seu grupo e com similar
trajetória, elaborou alguns temas políticos
no seu livro A Recusa do Ser—A Falência
do Pensamento Liberal (1971). Além de uma
crítica filosófica ao liberalismo, faz
a apologia do papel das elites e ataca -- neste
livro como em artigos publicados na Convivivm e
na revista Vozes--, o sistema hegeliano-tomista
de abertura para a esquerda do padre Henrique Lima
Vaz, SJ, líder da Ação Popular.
O temário
do grupo Permanência é, talvez, o menos
político dos diferentes grupos tradicionalistas
brasileiros. E, segura-mente, o mais popular, pela
penetração na imprensa e popularidade
de Gustavo Corção.
Ainda no Rio --sem ligação direta com
o grupo da Permanência, mas com preocupações
afins--, encontramos a personalidade de Jorge Boaventura,
autor de Marxismo, Alvorada ou Crepúsculo (1968)
e de Ocidente Traído (1979). Trata-se
de um converso ao tradicionalismo, com grande
atividade na imprensa e na luta anticomunista.
7. Grupo Fronteiras
Em atividade no final da década de trinta
e no início da de quarenta, em Recife,
encontramos a revista Fronteiras. O Pe. Antonio
Cinaco Fernandes, SJ nela publicou Jacques Maritain — As
Sombras de Sua Obra, depois editado em livro,
em 1937. Em 1940, Manoel Lubambo, então Secretário
da Fazenda de Pernambuco, publica Capitais
e Grandeza Nacional onde sustenta, apoiado na
doutrina social católica, que o capital é intangível
e tem primazia sobre o trabalho. O livro é uma
apaixonada defesa do capitalismo e uma crítica
feroz à justiça social. Antes de
preocupar-se com isto, caberia promover maior produção,
maior riqueza, proteção ao capital, à livre
iniciativa, à aventura ao risco e ao lucro.
Denuncia “a guerra marxista ao lucro”.
(13) Lubambo está na origem do ideário
econômico da TFP. São os únicos
tradicionalistas a aceitarem sem reservas o capitalismo.
8. Revista Vozes de Petrópolis
Em torno da velha revista Vozes de Petrópolis,
durante a década de trinta até pouco
depois de 1965, reuniu-se um grupo aguerrido defendendo
as teses tradicionalistas, quer na revista, quer na
editora.
Além de José Pedro Galvão de
Souza, já estudado, colaborador assíduo
com vários artigos contra a “Democracia
Cristã” (1953 e 1956), por
exemplo, destacavam-se individualidades como J.
Azevedo Santos, autor de comentadíssimos artigos
como o “Rolo Compressor Totalitário”,
denunciando Maritajn e o liberalismo católico,
e, sobretudo, a figura de Ascanio Mesquita Pimentel,
autor de numerosos artigos de ressonância, como “Os
Quatro Evangelhistas da Nova Cristandade”, depois
reunidos em livro da Vozes, Problemas do Catolicismo
Contem porâneo (1948), onde a constante é a
denúncia do liberalismo da esquerda católica.
Ainda em 1951, Vozes publicava, de Pimentel, o
livro O Liberalismo Ontem e Hoje — História,
Doutrina, Crítica, sempre na mesma temática.
A Editora Vozes, através de sua Biblioteca
de Cultura Católica, publicou, de D. A.
Almeida Morais, os seguintes livros de inspiração
tradicionalista: Filosofia da Liberdad;, Civilização
e Crise; e, Capital e Trabalho.
Em caráter marginal, sem serem tradicionalistas stricto
sensu, mas apresentando forte influência,
aparecem numerosos integralistas, a começar
pelo próprio chefe nacional, Plínio
Salgado. Consultar O Ritmo da História (1951),
entre outros de seus livros, além de seus
discursos nos anos vinte como deputado estadual
paulista. João Scantimburgo e Heraldo Barhuy,
ligados ao IBF e de outra inspiração,
também militaram algum tempo nas hostes tradicionalistas.
Esta influência explicaria a dificuldade em
identificar como Fascismo o pensamento de Plínio
Salgado, encontrada por vários estudiosos.
Terminamos o panorama dos principais fautores do tradicionalismo
político no Brasil. Importa precisarmos agora
a doutrina comum e suas teses políticas.
9. A Doutrina
Política do Tradicionalismo Brasileiro
Como demonstraram as Primeiras Jornadas Brasileiras
de Direito Natural (27 a 30/9/77), realizadas em São
Paulo sob o patrocínio do grupo da Hora Presente,
os tradicionalistas têm consciência de
formarem um grupo autônomo no universo cultural
brasileiro. E representam a família espiritual
de mais longa vida e fôlego na cultura nacional.
Ainda recentemente, voltou a funcionar, com caráter
tradicionalista, a revista Mundo Econômico,
Política e Social, sob a direção
de José Orsini que iniciou, em 1976, a publicação
do Clube do Livro Cívico, de inspiração
tradicionalista.
No plano político, em primeiro lugar é preciso
frisar que o tradicionalismo não configura um
totalitarismo.
O tradicionalismo denunciou o totalitarismo em alguns
dos melhores e. únicos livros sobre o tema na
literatura nacional. Refiro-me a O Estado é Meio
e não Fim, de J. C. Ataliba
Nogueira, e a obra de José Pedro Galvão
de Souza, Origens do Totalitarismo e Estado Tecnocrático. Em
qualquer dos sentidos do termo totalitarismo,
seja o de Cari Friedrich ou de Hannah Arendt, o tradicionalismo
não pode ser arrolado como tal. Sempre situam,
fora do Estado, à Igreja. Atribuem a esta ingerência
na Educação, na Cultura e na Família,
que permanecem livres, embora censuradas.
Inexiste dúvida quanto ao autoritarismo dos
tradicionalistas no sentido da conceituação
de Juan Linz.
O elitismo de sua visão política é inegável,
bem como o caráter não mobilizatório
de suas doutrinas.
A adesão à monarquia é latente
em todos eles, embora explícito apenas na Pátria
Nova. Alguns propendem para o parlamentarismo; todos
são corporativistas; o direito natural, entendido
em sentido conservador e tomista, é outra tese
comum.
Relações complexas são mantidas
com o tomismo, pois o tradicionalismo é uma
ideologia e sua adesão ao tomismo dá-se
porque faz parte da tradição; o ethos filosófico
dos tradicionalistas é reduzido; seu discurso
não faz apelo à “ordem das razões” mas
move-se num nível ideológico emocional.
Em comum com outros autoritarismos da década
de trinta, partilham do modelo proposto, por Bolivar
Lamounier, para interpretar o pensamento da época.
Isto é, aceitam: “1) Predomínio
do princípio estatal sobre o princípio
do mercado; 2) Visão orgânica
corporativa da sociedade; 3) Objetivismo tecnocrático
(no sentido da dicotomia país real x abstrato),
isto é, a crença que para a realidade
nacional deve corresponder ‘um’ modelo
político a ela adaptado, e não no sentido
de defesa da tecnocracia, embora admita uma limitação
da atividade da classe política; 4) Visão
autoritária do conflito social; .5) Não
organização da sociedade civil; 6) Não
mobilização política; 7)
Elitismo e voluntarismo como visão dos processos
de mudança política; 8) O Leviatã Benevolente
(O Estado)”. (14)
Além das características iniciais já apontadas,
a grande diferença do autoritarismo tradicionalista
daquela professado por Azevedo Amaral, Oliveira Vianna
e Francisco Campos, estudados por Bolivar Lamounier,
consiste na vinculação explícita
do modelo político autoritário, a uma
metafísica tomista e ao direito natural e
adesão mais forte ainda a uma teologia
da história semi-maniqueísta concebendo-a
como luta sem tréguas entre Revolução
e Contra-Revolução.
Outra característica diferencial entre os autoritarismos
da década de trinta e o tradicionalismo é o
repúdio total, deste, ao liberalismo, enquanto
que, em Oliveira Vianna, por exemplo, apenas se postergava
para um futuro a instituição de sociedade
liberal.
O epíteto de reacionarismo aplicado e usado
pelos próprios tradicionalistas não nos
deve enganar. Quase nunca são partidários
do status quo. De fato, julgam a sociedade
atual infeccionada pela Revolução
e preconizam a volta a uma ordem natural e cristã,
que julgam ter-se realizado em parte na cristandade
medieval. Arrolam-se, os tradicionalistas, entre os
mais sanhudos críticos da nossa civilização.
Nesse sentido, como já observara Karl Mannheim,
apresentam uma forma de utopia, diversa da utopia socialista,
por colocar seu ideal-tipo no passado.
A adesão ao jusnaturalismo não deve
induzir em erro. Os tradicionalistas, na sua maioria,
são historicistas e anti-racionalistas
em política. Seu jusnaturalismo é do
tipo neotomista, isto é, mínimo, reduzido
a alguns princípios e servem para fundamentação
da ordem moral e política. Coexiste com a crença
na irredutibilidade do real nacional a padrões
universais, na valorização da tradição
num espírito do povo. Os tradicionalistas coincidem
também nos mesmos adversários:
Voltaire, Rousseau, a Reforma, Pombal, a Revolução
Francesa e o Comunismo. Todos aparecem no panteão
dos arquinimigos.
Porém, o que mais os caracteriza, segundo
um mote de Eric Voegelin, grande mestre tradicionalista
de ciência política. é o julgarem
que a principal divisão entre os homens não é entre
totalitários e liberais, mas entre imanentistas,
naturalistas, liberais e totalitários,
de um lado, e transcendentalistas religiosos e filosóficos,
de outro.
Notas de Ubiratan Macedo
.(1) O pensamento político de Jackson de Figueiredo
será analisado por GOMES, Perilio, Jackson
de Figueiredo, o Doutrinário Político, Rio,
1926; ABRANTES, Jorge, O Pensamento Político
de Jackson de Figueiredo, Recife, 1954; NOGUEIRA,
Hamilton, Jackson de Figueiredo, o Doutrinário
Católico, Rio, 1928; e em 1962 por IGLÊSIAS,
Francisco, “Estudo sobre o Pensamento Reacionário:
Jackson de Figueiredo” incluído no seu
livro História e Ideologia, São
Paulo, Perspectiva, 1971.
(2). Op. cit., p. 110.
(3) A Igreja e o Pensamento Contemporâneo, Lisboa,
1944, p. 381.
(4) Este programa aparece defendido em detalhes no
livro de VIEIRA, Paim-Organização
Profissional e Representação de Classes, São
Paulo, 1933. Arlindo Veiga dos SANTOS explanou o programa
em Para a Ordem Nova, São Paulo, 1933; n’As
Raízes Históricas do Patrionovismo, São
Paulo, 1946, ~ no volume-síntese Orgânica
Patriovista, São Paulo, 1950; na plaquete “Maurras
- Defensor da Realidade” (São Paulo, 1953)
reivindicou a monarquia como já e fizera na
sua tradução de VALDOI.JR, Jacques, A
Organização Monárquica do
Estado, São Paulo, Ed. Reconquista, 1956,
e na sua tradução A Filosofia Política
de S. Tomás de Aquino, 3•a edição.
São Paulo, 1956.
(5) MOURA, Dom Odilão, As Idéias
Católicas no Brasil, São Paulo,
Ed. Convívio, 1978, pp. 213-4.
(6) Carta Pastoral sobre a Seita Comunista, 2.~
ed., 1963, p. 121.
(7) Op. cit., pp. 142-3.
(8). Op. cit., p. 147
(9) Op cit., pp. 159-160.
(10) Revolução e Contra~Revolução,
p. 28.
(11) Op. cit., p. 44.
(12) Dois Amores — Duas Cidades, 2.° vol., p. 340.
(13) Capitais e Grandeza Nacional,
pp. 44 e 99.
14) LAMOUNIER, B., “Formação
de um Pensamento Político Autoritário”,
in História Geral da Civilização
Brasileira, vol. 9, São Paulo, 1977, p. 359.
O
presente texto apareceu na obra coletiva As
idéias políticas no Brasil. Volume II. Sâo
Paulo, Coonvivio, 1979, págs. 227-248. Suprimimos
a Introdução (caracterização
geral do tradicionalismo para diferenciá-lo
do conservadorismo liberal), bem como a parte inicial
do subtítulo 1. Origens do tradicionalismo
na cultura brasileira, por considerar que, ambos
os aspectos, acham-se suficientemente esclarecidos
nos estudos antes transcritos.
|